Ano bíblico:    -  Áudio   |  Lições:   Texto  -  Áudio  -  Palm  -  Ppt  |  Meditações: Texto 

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Adventismo no Brasil Parte V


** OS PRIMEIROS BATISMOS
Pastor Frank Westphal (sentado) e família
Pastor Frank Westphal (sentado) e famìia
O mesmo navio – Magdalena – que trouxe o casal Thurston ao Brasil levou o pastor Frank Henry Westphal para a Argentina. Eram poucos os primeiros representantes da Igreja Adventista no continente sul-americano. No final de 1894, num território de 15.500.000 quilômetros quadrados, somente dez homens se dedicavam à proclamação da fé adventista, oralmente ou por escrito. Um deles era o pastor Westphal, outro era o diretor de colportagem, e os outros eram colportores, incluindo Stauffer e Bachmeyer. Mas, em apenas cinco anos, os dez já eram duzentos![13]
Neste mesmo ano – 1894 – Albert Bachmeyer chegou ao Estado de Santa Catarina. Grande foi sua alegria  quando, ao oferecer livros a uma família em Brusque, descobriu que havia adventistas ali. Imediatamente, transmitiu a boa notícia a Thurston que, por sua vez, escreveu informando o pastor Westphal, na Argentina.
Westphal foi o primeiro ministro adventista enviado para servir na América do Sul. Ordenado ao ministério em 1883, em Michigan, dedicou-se à missão urbana de Milwaukee e lecionou História no Departamento Alemão do Union College. Em 1894 foi chamado para servir no continente sul-americano.
O pastor F. H. Westphal veio para a América do Sul juntamente com Willian Henry Thurston, que era irmão da esposa do pastor. Thurston, como já vimos, ficou no Rio de Janeiro e Westphal seguiu para a Argentina.
Em fevereiro de 1895, o pastor Westphal desembarcou no Rio de Janeiro, onde o esperavam o casal Thurston e o colportor A. B. Stauffer. Sobre esta experiência Westphal escreveu: “Quando a Associação Geral me enviou para o grande continente meridional, eu fui nomeado superintendente da Missão Costa Leste da América do Sul, que incluía Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil. Assim, eu me senti na obrigação de fazer uma visita ao Brasil logo que possível. Após ter passado aproximadamente seis meses na Argentina e no Uruguai, zarpei para o Brasil em fevereiro de 1895. Quando nosso barco chegou, ficamos de quarentena [procedimento comum na época] numa linda ilha [Ilha das Flores] perto do Rio de janeiro, onde permanecemos muitos dias.”[14]
Acompanhado por Stauffer, o pastor Westphal seguiu primeiro para o interior de São Paulo, para batizar os  primeiros conversos naquele Estado. “A terra era muito traiçoeira” – conta Westphal – “e encontramos muitos desmoronamentos em nosso caminho, alguns dos quais até mesmo soterraram o trilho do trem. Tivemos que viajar a pé 60 quilômetros no abrasador e sufocante calor de um verão tropical, mas arranjamos um trem carregador de cascalho para o restante da viagem. Fomos a Piracicaba para realizar nosso primeiro batismo no Brasil, pois morava nessa cidade um crente que já obedecia à verdade havia algum tempo, tendo até mesmo traduzido o livro Caminho a Cristo para o português.”[15]
O crente a quem o pastor Westphal faz referência é o professor Guilherme Stein Jr., justamente o primeiro adventista brasileiro a ser batizado, numa manhã de abril de 1895. Seu batismo foi realizado no rio Piracicaba, que na língua indígena significa colheita de peixes. “Interessante o simbolismo, porque este primeiro batismo seria apenas o primeiro passo para uma grande colheita de almas.”[16]
“Guilherme Stein Jr. nasceu em Campinas, em 13 de novembro de 1871, e estudou nessa cidade, num colégio alemão luterano. Em 1893, transferiu-se para Piracicaba, indo residir na casa dos pais de Maria Krähenbühl, com quem se casou posteriormente. Os Krähenbühl eram metodistas. Guilherme Stein começou a freqüentar a Igreja Metodista e converteu-se. Tornou-se ardoroso estudante da Bíblia. Levantava-se todos os dias às cinco horas da manhã, para ler e estudar a Palavra de Deus antes de ir para o trabalho…
“Maria Krähembühl contou a Guilherme Stein que sua avó possuía um livro que lhe fora vendido por dois homens que não tomavam café (Albert Staufer e Albert Bachmeyer). O livro era Der Grosse Kampf (O Grande Conflito). Foi grande o entusiasmo e intereresse de Guilherme Stein ao ler esse livro. Desejou mais literatura e ao encontrar no próprio livro o número de uma caixa postal no Rio de Janeiro, entrou em contato com Willian Henry Thurston, que lhe remeteu mais literatura e ao mesmo tempo escreveu ao seu cunhado Frank Henry Westphal, na Argentina, para que viesse conhecer o progresso missionário adventista no Brasil através da colportagem.”[17]

primeiro converso batizado no BrasilGuilherme Stein Jr.: primeiro converso batizado no Brasil
Stein Jr. desempenhou papel importante na obra adventista do Brasil como colportor, evangelista, professor, administrador, redator e editor. Sobre seu batismo, diz o pastor Westphal: “Escolhemos para o batismo um lugar em que uma pequena ponta  de terra se projetava em direção às águas. Temendo que pudesse atolar-me naquele local, pedi que o irmão Stauffer me segurasse pelo paletó com uma das mãos, e com a outra se agarrasse a um galho de árvore, permitindo assim que eu ajudasse também o candidato. Desta forma entramos na água e foi realizado o batismo.”[18]
Local do primeiro batismo adventista no Brasil
Local do primeiro batismo adventista no Brasil
O segundo batismo ocorreu logo em seguida, em Rio Claro, com dois conversos: Guilherme e Paulina Meyer. Logo depois, mais seis pessoas foram batizadas em Indaiatuba: Guilherme Stein (pai), sua esposa e mais quatro filhos. A etapa seguinte era Santa Catarina.
Antes de chegar a Brusque, no dia 30 de maio de 1895, o pastor Westphal pregou a mensagem nas cidades de Joinville, Blumenau e outras da região. Deixou mais de 30 observadores do sábado em Joinville (dentre eles os ex-seguidores de Stangnowsky), preparando-se para um batismo futuro.
Já em Brusque, Westphal diz ter encontrado os primeiros grupos de conversos aos adventismo, no Brasil. “O primeiro grupo a ser visitado vivia numa pequena comunidade um pouco distante de Brusque”, lembra Westphal. “Um jovem montado numa mula foi o meu guia. Iniciamos a viagem à uma hora da manhã, viajando por montanhas altas e, quando o dia amanheceu, estávamos bem acima das nuvens, que pareciam belos lagos. Após viajarmos diversas milhas, alcançamos o lar do irmão Guilherme Belz, que alguns anos antes havia aceitado a mensagem.”[19]
Enquanto visitava a Vila de Brusque e suas imediações em busca dos crentes dispersos, o pastor Westphal teve que enfrentar a forte oposição e intransigência dos religiosos da época – tanto luteranos como católicos – que se consideravam donos da verdade. Algumas vezes esteve a ponto de perder a vida, mas prosseguiu em sua missão.
Emocionados, os novos conversos ouviram pela primeira vez a pregação de um ministro adventista. Em 8 de junho de 1895, foi realizado o primeiro batismo de oito pessoas no rio Itajaí-Mirim, uns cinco ou seis quilômetros acima da Vila de Brusque. Foram registradas as seguintes pessoas: o casal Ludwig e Henriette Look, Carlos Look Filho e Ida Look, o casal Karl e Hulda Thrun e os filhos Hermann, Gustav e Isidor Thrun.
Três dias depois, o pastor Westphal realizou o segundo batismo em Braunschweig (Gaspar Alto). Naquele dia, mais 14 pessoas foram batizadas: o casal Guilherme e Johanna Belz, Francisco e Gerthrud Belz e Anna Wagner; o casal Augusto e Johanna Olm, Margarete Olm, Ricardo Olm e suas irmãs Martha e Clara Olm; Hermann e Emill Olm o colportor Albert Bachmeyer que, embora convertido, ainda não havia sido batizado.[20] (Em 14 de dezembro desse mesmo ano, foi realizado o primeiro batismo adventista no Estado do Espírito Santo. O Pastor Huldreich Graf batizou na ocasião 23 pessoas, dentre as quais os pais do Pastor Gustavo Storch.[21])
Certo dia, o pastor Westphal estava fazendo os preparativos para uma reunião de sexta-feira à noite e sábado, no final da qual haveria uma Santa Ceia, em Brusque. Entretanto, o dono da casa onde os adventistas iriam se reunir não quis mais cedê-la; devolveu o dinheiro do aluguel e pediu o recibo de volta. O pastor Westphal perguntou o porquê daquilo e o proprietário explicou que o padre o havia visitado, ameaçando denunciá-lo no sermão de domingo, caso ele permitisse que os adventistas usassem a casa. Como aquele senhor era comerciante, temeu que aquilo trouxesse vexame sobre ele, atrapalhando seu negócio. Percebendo que o homem estava realmente preocupado, o pastor Westphal devolveu-lhe o recibo pegando o dinheiro de volta.
O gerente de uma fábrica de roupas, sabendo do problema, cedeu uma grande sala para realizarem o culto de sexta-feira à noite. Mas, na manhã seguinte, o proprietário da fábrica, também por imposição do pároco, mandou suspender a cessão do local. Depois de procurarem sem sucesso outro lugar, os adventistas reuniram-se à margem do rio Itajaí-Mirim, onde havia toras de madeira que serviram de assento, e uma tora maior, com superfície plana, que serviu de mesa para a Santa Ceia.
Sobre essa reunião, ocorrida em junho de 1895, disse o Pastor Westphal: “Naqueles bancos de madeira junto ao rio formamos o primeiro grupo organizado de adventistas do sétimo dia do Brasil[22] e celebramos a Ceia do Senhor.”[23] Augusto Olm foi escolhido para a função de primeiro-ancião e Guilherme Belz, para a de diácono. Os cultos eram realizados alternadamente na casa dessas duas famílias, até que, no dia 23 de março de 1898, foi inaugurado o singelo templo de Gaspar Alto.
Além dos membros batizados, vários interessados na mensagem participaram daquela Santa Ceia às margem do Itajaí-Mirim. Um deles era uma mulher proprietária de uma destilaria. Durante o culto ela nada dizia, mas lágrimas lhe rolavam dos olhos, porque um de seus filhos havia falecido justamente em decorrência do alcoolismo e um outro estava indo pelo mesmo caminho. No final da cerimônia, ela retornou decidida para casa. Fechou a destilaria e transformou o salão de bailes numa casa de culto.
Depois de passar cinco meses longe da Argentina, o pastor Westphal ansiava por rever a família. Planejava  viajar no dia seguinte à cerimônia às margens do Itajaí-Mirim, quando recebeu mensagem de um comerciante, pedindo-lhe para visitá-lo à noite, antes de viajar. O homem havia convidado várias pessoas para ouvir o pastor falar sobre a Palavra de Deus, e Westphal aceitou o convite, pregando um sermão sobre “a obra do selamento”. O próprio pastor Westphal conta o que ocorreu então: “Eu estava finalizando meus comentários com um apelo fervoroso para que meus ouvintes se preparassem para a vinda do Senhor. Houve um súbito barulho, como o tiro de um canhão. Inconsciente do que havia ocorrido, mas vendo meus amigos pegando pedras no chão, eu olhei para a janela atrás de mim. Lá, suspensa pela frágil cortina, havia uma pedra grande, de aproximadamente duas vezes o tamanho do punho de um homem. Então meus amigos me disseram que oito homens tinham se reunido perto da janela com uma pedra cada um. E quando um deles contou até três, todos juntos atiraram as pedras ao mesmo tempo, tendo como alvo minha cabeça. Mas nenhuma pedra sequer tocou em mim. O comerciante, profundamente emocionado por toda esta maravilhosa manifestação do cuidado protetor de Deus, ajoelhou-se e orou.”[24]
Logo após a reunião, Westphal planejava voltar ao hotel a fim de prosseguir viagem durante à noite, mas seus ouvintes insistiram para que não fizesse isso, pois os agressores poderiam estar à beira da estrada aguardando para um novo ataque. Westphal disse que não poderia se arriscar a perder o navio para Buenos Aires. Ele estava preocupado com a esposa, que não sabia falar espanhol, e com os filhos pequenos.
Mais tarde Westphal soube que, de fato, aqueles oito homens haviam se escondido atrás de alguns arbustos no caminho por onde ele voltou para o hotel. Mas “o poder protetor de Deus lhes impediu de me atacarem”, escreveu o pastor. “À uma hora da manhã eu iniciei minha jornada a cavalo, regozijando-me por ter escapado sem nenhum arranhão.”
Depois de uma longa cavalgada, cansado e exausto, Westphal alcançou o navio que rumava para a Argentina. Como seu dinheiro estava no fim, ele comprou uma passagem de terceira classe, dormindo num banco sem colchão. Numa parada no Rio Grande do Sul, Westphal comprou um cobertor a fim de melhor enfrentar o clima frio do sul.
Dias depois, quando finalmente chegou em casa, a esposa e o filho de quatro anos foram recebê-lo à porta, mas a filhinha Helen não apareceu. A Sra. Westphal, com o olhar triste, contou então ao esposo que sua filha havia falecido havia duas semanas, sendo sepultada no cemitério de Chacarita, num lugar próprio para estrangeiros. Muitas cartas foram enviadas ao Brasil, relatando a situação de Helen, mas nenhuma delas chegou às mãos do pastor.
“À medida em que ela me contou os detalhes acerca da batalha perdida para a morte”, relata Westphal, “nossos corações sofreram, mesmo que não desejássemos reclamar. Além do mais, essa triste experiência abriu mais ainda nossa compreensão do maravilhoso amor de Deus. Percebemos mais profundamente quão grande foi o amor do Pai Celeste em ter dado Seu único Filho para morrer uma morte cruel, numa terra estranha, distante de Seu lar celestial e de todos aqueles de quem recebia amor e simpatia. Isto nos levou a consagrar nossas vidas uma vez mais a Deus e à Sua obra, e trabalhar fielmente, para que venha logo o dia em que o Senhor aparecerá e devolverá nossa pequena filhas aos braços de sua mãe.”
Sobre aqueles dias difíceis, a esposa de Westphal escreveu: “Longas viagens foram feitas em assentos de madeira. Dormíamos em camas duras, pois naqueles dias poucas pessoas possuíam colchões de mola. Em alguns lugares havia muitos mosquitos e pulgas. … Aqueles foram dias de bênçãos espirituais, e não existe arrependimento pelo sacrifício que fizemos. Se pudesse, viveria aqueles dias novamente e faria um trabalho melhor pelo meu Mestre. Porém, ‘passamos por este caminho apenas uma única vez’, portanto, vamos ser fiéis enquanto os dias ainda estão se esvaindo.”[25]
“Nunca mais tive o privilégio de rever a cidade de Brusque”, escreveu Westphal, “mas estou sabendo que novos membros foram acrescentados ao grupo de lá, e já aumentou para uma igreja de duzentos membros.”[26]
Poucos anos depois, grupos de conversos adventistas já realizavam a Escola Sabatina em Campos dos Quevedos e Taquari (RS), Joinville (SC), Curitiba (PR), Rio Claro e Indaiatuba (SP) e Santa Maria (ES). O árduo trabalho dos missionários pioneiros prosperava, e mais e mais pessoas eram salvas para o Reino de Deus.
Primeira conferência pública em Gaspar Alto. Atrás, o primeiro templo, de madeira
Primeira conferência pública em Gaspar Alto. Atrás, o primeiro templo, de madeira
Primeiro templo de Gaspar Alto, inaugurado em 23 de março de 1898
Primeiro templo de Gaspar Alto, inaugurado em 23 de março de 1898
Segundo templo de Gaspar Alto, construído após a II Guerra Mundial
Segundo templo de Gaspar Alto, construäo após a II Guerra Mundial
O DIA DO SENHOR
“Vocês são a luz do mundo todo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte. Ninguém acende uma lamparina para pôr debaixo de um cesto. Ao contrário, ela é colocada no lugar próprio para que ilumine todos os que estão na casa.” Mateus 5:14 e 15 BLH
A mensagem adventista, embora tenha se estabelecido primeiramente em Gaspar Alto, não conseguiu ficar escondida naquele pequeno vale em meio às montanhas. Os raios de luz do evangelho foram pouco a pouco se espalhando. As pessoas comentavam; os folhetos e livros continuavam a fazer sua parte.
Em Lageado Baixo, a menos de 20 quilômetros de Gaspar Alto, Roberto Fuckner, nascido em Holstein, na  Alemanha, ouviu falar que seu amigo Guilherme Belz e outras famílias estavam guardando o sábado.
– Sabe o quê, Maria? Eu tenho que ir a Gaspar Alto. Ouvi falar que o Guilherme e outros estão guardando o sábado. Eles estão com a cabeça virada e preciso ir lá endireitar a cabeça deles.
Na sexta-feira seguinte, à tarde, Roberto pegou o chapéu e a bengala, despediu-se da esposa Maria, e partiu a pé para Gaspar Alto. Ambos eram piedosos luteranos e não podiam permitir que o amigo Guilherme se deixasse levar por “essas novas idéias estranhas”.
Depois de uma caminhada de cerca de três horas por um estreito atalho, Roberto chegou até a casa do amigo. Guilherme o recebeu sorridente, vestindo um bonito terno escuro.
– Boa tarde, amigo Roberto! O que o traz até minha casa?
– Boa tarde, Guilherme. Por acaso você vai a algum casamento, vestido assim de terno e gravata? – pergunta Roberto, sem esconder a estranheza.
– Não, amigo – diz Belz calmamente. – As pessoas costumam se vestir bem, quando vão receber um prefeito ou governador. Eu me arrumei assim pois vou receber Jesus. Hoje é sábado, o dia do Senhor.
Franzindo o cenho, Roberto responde:
– É justamente por isso que eu vim.
Os amigos entraram e conversaram quase a noite toda. Passaram-se o sábado e a manhã de domingo. À tarde, Roberto se despediu de Guilherme e empreendeu a caminhada de volta a Lageado Baixo.
Quando já estava próximo de casa, seus amigos, num bar, o convidaram para jogar baralho e beber cachaça. “Não tenho tempo agora”, foi a resposta do alemão apressado. Chegando em casa, tirou o chapéu, guardou a bengala e sentou-se à mesa. Sua esposa aguardava curiosa uma palavra do marido. Roberto, sério, começou a comer em silêncio. Maria não se conteve:
– Como é, Roberto? Nem me conta nada! Endireitaste a cabeça do Guilherme?
Roberto levanta o rosto, encara a esposa e responde com convicção:
– Não, Maria. O que eu descobri é que, se nós queremos praticar a verdade, temos que guardar o sábado também!
– O quê!? – Maria arregala os olhos. – Em vez de tu endireitares a cabeça deles, eles viraram a tua?
– Não, Maria. Vai buscar a tua Bíblia – Roberto tira do bolso da camisa um papel rabiscado. – Eu tenho marcadas aqui as passagens.
Maria vai até o quarto e traz a velha Bíblia que já havia sido de sua mãe, na Alemanha.
– Agora encontre o texto de Eclesiastes 12, versículo 13.
– Aqui está – diz Maria, segundos depois.
– Então leia.
“– De tudo o que se tem ouvido, o fim é: teme a Deus e guarda os Seus mandamentos, porque este é o dever de todo homem.”
– Veja, Maria, aí diz “todo homem”. Portanto, os mandamentos não são só para o povo judeu, como nos haviam ensinado. Além do mais, de acordo com o livro de Gênesis, o sábado foi dado a Adão e Eva na criação do mundo, quando não havia sequer um judeu ou outro povo qualquer sobre a Terra. Agora leia Êxodo, capítulo 31, verso 18.
“– E deu a Moisés (quando acabou de falar com ele no monte Sinai) as duas tábuas do testemunho, tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus.”
– Veja só a importância da lei! O próprio Deus a escreveu com Seu dedo em tábuas de pedra…
– Mas o que isso tem a ver com o sábado, Roberto? – interrompe Maria, já quase impaciente.
– Leia o quarto mandamento em Êxodo 20:8 a 11 – diz Roberto, apontando a mão para a Bíblia aberta diante de Maria.
– Está bem. Aqui está: “Lembra-te do dia de sábado para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra, mas o sétimo dia é o sábado do Senhor teu Deus…” – Maria levanta os olhos sem terminar de ler o texto e exclama:
– Roberto, como pode?! Toda a vida nós lemos a Bíblia e nunca notamos isto!
– Não estás vendo, agora? Não achas também que, se queremos praticar o que está na Palavra de Deus, temos que guardar o sábado?
Roberto toma a Bíblia das mãos de Maria e lê outras passagens: “…Até que o céu e a terra passem, nem um jota ou til se omitirá da lei…” (Mateus 5:18); “Se queres entrar na vida, guarda os mandamentos” (Mateus 19:17); “E, chegando a Nazaré, onde fora criado, [Jesus] entrou num dia de sábado, segundo o Seu costume, na sinagoga…” (Lucas 4:16); “E as mulheres que tinham vindo com Ele da Galiléia… no sábado repousaram conforme o mandamento” (Lucas 23:55-56); “E santificai os Meus sábados e servirão de sinal entre Mim e vós” (Ezequiel 20:20); “Qualquer que guardar toda a lei e tropeçar em um só ponto torna-se culpado de todos” (Tiago 2:10); “Se Me amardes, guardareis os Meus mandamentos” (João 14:15).
O casal continuou estudando a Bíblia. Roberto visitou Guilherme mais umas duas ou três vezes, quando finalmente decidiu-se guardar o sábado e a ser um novo proclamador dessa mensagem. Em pouco tempo, as famílias Pollhein e Zabel já estavam unidas aos Fuckner, professando a mesma fé.
No ano de 1898, o grupo de adventistas se reunia na sala da casa dos Fuckner, e as músicas que cantavam aos sábados eram ouvidas por alguns vizinhos. Um deles era Carlos Zabel, com quem Roberto havia estudado a Bíblia em algumas ocasiões. “Que mal há em eu trabalhar no dia de sábado?” – justificava-se ele. “Lembre-se, Carlos” – dizia Roberto, – “Eva também pensou em que mal havia comer um simples fruto. O mal não está no ato em si, mas na desobediência à vontade de Deus. É nas pequenas coisas que o Senhor testa Seus filhos.” Mas Zabel não se rendia aos argumentos do amigo.
Numa manhã de sábado, Carlos estava trabalhando na roça de aipim, num terreno elevado, quando ouviu o grupo adventista entoando hinos do hinário luterano (único à disposição na época) Singet Dem Herrn (“Cantai ao Senhor”). Aquilo o comoveu. Carlos colocou a enxada sobre o ombro, desceu o morro e entrou em casa apressado. Sua esposa Alvina ficou surpresa.
– Já vieste da roça?! O que foi que aconteceu?
– Vai mudar de roupa, Mulher. Nós vamos lá na Escola Sabatina.
Os dois colocaram suas melhores roupas, foram até a casa dos Fuckner e dali para frente passaram a pertencer à Igreja Adventista do Sétimo Dia, que cada vez mais se desenvolvia em Lageado Baixo. Roberto Fuckner desempenhou a função de primeiro ancião do grupo, cargo que passou, posteriormente, a seu filho Oswaldo.
Roberto Fuckner foi um dos pioneiros em Lageado BaixoRoberto Fuckner foi um dos pioneiros em Lageado Baixo
Oswaldo e Christina Fuckner tiveram 12 filhos, um dos quais (Luiz Lindolfo), iria tornar-se pastor. Christina dava aulas de alfabetização para as crianças da localidade e gostava de escrever poemas. Um deles, transcrito abaixo, fala do surgimento da Igreja Adventista no Brasil:
Ó, Itajaí, porto glorioso!
Tão belo e maravilhoso,
Pois de todo o Brasil
És o porto mais gentil.
És o porto mais amado,
Mais bendito e sagrado.
De ti nos veio a salvação.
Louvamos-te de coração.
Por ti o Deus dos altos Céus
Mandou-nos mensagens Suas.
Um missionário ali passou
E revistas ali deixou.
Um senhor, um professor
Foi quem as revistas ali achou
Para Brusque as levou
E mais revistas encomendou.
Para uma venda as levou
E por bebidas as trocou
E com as compras embrulhadas,
A Gaspar Alto foram levadas.
Guilherme Belz foi o senhor
Que a revista ali levou
A seus vizinhos convidou
E a Escritura examinou.
E mais revistas encomendaram;
Sempre mais as estudaram.
E para o batismo preparado,
Um pastor foi convidado.
Ó, Brusque, tens um grande preço,
Pois do batismo és o berço.
Em ti foram batizados
Os primeiros candidatos.
A mensagem subiu a Lageado
Ali também foi aceita.
Mais tarde um grupo preparado
Foi em igreja organizado.
Em Gaspar Alto trabalharam;
Até um ginásio edificaram.
E jovens foram educados
Como missionários preparados.
Pastor John Lipke, o professor,
Foi quem aos jovens ensinou.
Estando bem preparados,
À Obra foram enviados.
A todos os Estados foi levado
O Evangelho aqui iniciado.
A verdade assim foi ensinada
E a lei de Deus observada.
Agora muitos crentes
De toda raça e toda a gente,
Clamam: “Jesus Cristo, vem
Nos levar à Jerusalém!”
Lá, naquela Cidade linda,
Tão querida e tão infinda,
Veremos o Senhor Jesus
Que por nós morreu na cruz.
Logo a Terra renovada
Sim, será nossa morada.
E todos os sábados nos reuniremos,
Nosso Redentor louvaremos.
Vinde, jovens companheiros,
Ao encontro de Jesus.
Logo sempre viveremos
Com Jesus, na Sua luz.*
(*) Original em alemão: Christina Fuckner (1894–1976), batizada em 1910. Tradução: Helga Nogueira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário